Diário de Sherazade
Conheça as aventuras de uma contadora de histórias e se encante com o maravilhoso universo da literatura infantil!...
quinta-feira, 24 de julho de 2014
Dicas
1. Como começar: recepção do público com música ambiente para asserenar e entrar no clima das histórias
Não é aconselhável iniciar a contação da história sem um preparo prévio ou de forma inesperada. Isso pode acarretar um estranhamento por parte das crianças, sobretudo se não estão acostumadas à escuta de histórias. É importante que os pequenos entrem no clima de magia e fantasia que as narrativas evocam. Alguns contadores propõem que as crianças pronunciem uma palavra mágica juntas, como “RIBOMBANCHO”. Outros cantam músicas, como “Era uma vez... assim vai começar a linda história que agora vou contar. Bate palmas, minha gente, bate palmas outra vez, bate palmas bem contente, vou contar... era uma vez!”. Cada contador pode inventar uma melodia para essa canção. Além disso, aconselha-se receber todos em um ambiente calmo e sereno, onde paz e alegria que a contação de histórias transmitirá comece na recepção para o momento tão esperado e sonhado. As músicas ajudam na manutenção da atmosfera lúdica e criativa.
2. Usar um figurino ou um objeto que chame atenção da garotada
O contador de história precisa encantar as crianças, contagiá-las com uma atmosfera mágica e um figurino ou um simples objeto, como um chapéu, um arco ou diadema, um avental, um par de luvas podem ajudar a instaurar um clima de fantasia. Contudo, nada de exageros, pois a estrela deve ser a história, e não o contador.
3. O antes, o durante e o depois da história
Um bom contador de histórias sabe coordenar bem o antes, o durante e o depois da história. Inicialmente, pode fazer perguntas que estimulem a escuta da história. Por exemplo, se a narrativa é sobre um cachorro, pode-se perguntar às crianças se elas têm um animal de estimação. Se é sobre uma flor, pode-se perguntar quem tem plantas em casa, se elas já viram um jardim. Durante a história, mantenha o contato visual com as crianças, mediante o “olho no olho” e desconsidere gentilmente, com um sorriso, comentários excessivos para não interromper a história. Após a história, resgatar possíveis comentários feitos durante a contação e recolher as impressões da criançada sobre o conto narrado. Atenção, não explique a história! Cada criança tem uma experiência particular de entendimento da história e não cabe a você impor a sua leitura como a única possível.
4. Haja com naturalidade
Não tente imitar ninguém na hora de contar uma história. Dizem até que não se ensina contação de histórias, pois cada narrador tem sua maneira peculiar de contar uma história. Além disso, só conte histórias que encantem você, a fim de que possa transmitir bem a verdade da história para a criança. Fique à vontade com as pessoas que estão vivendo esse momento mágico com você, pense na mensagem positiva que histórias trazem para todos, reflita acerca do prazer que você está aliando à leitura com a prática de contação de histórias, na vida da criança. Cultive gente, pois todo conto é um encontro!
5. Conhecer a história
Procure ler várias vezes a história, procure estudar a história e, por fim, procure memorizar apenas o roteiro da história, pois não é necessário decorá-la na íntegra. Sabemos que o contador é sempre um coautor das histórias que conta. Além disso, todo contador de histórias deve ter o seu próprio repertório, o conjunto de histórias que o encanta e que ele pode contar em qualquer hora, em qualquer lugar. Por isso, o contador de histórias precisa ser um ótimo leitor e um bom pesquisador, precisa ter espírito de estudante.
6. Prepare sua apresentação
É importante a preparação para a apresentação das histórias, com alguns ensaios. Não exercite apenas o roteiro, recheie as histórias com expressão corporal e facial que enriqueçam a atividade. Se quiser, use objetos para a contação, mas evite objetos redundantes. Por exemplo, uma echarpe pode virar um vestido ou uma gravata, um leque pode virar a saia de uma personagem ou uma borboleta. Você pode, igualmente, caracterizar-se como uma das personagens, um rei ou uma princesa, além de utilizar um painel como cenário. Essa preparação proporcionará segurança ao contador e muita alegria na plateia para ouvir as histórias de coração aberto.
7. Voz suave e alta (“mastigada”);
Pronuncie bem as palavras, em um tom alto, mas não gritando. Cuidado para não diminuir o tom de voz após os momentos iniciais da história. Alguns contadores se utilizam de microfones portáteis, existe essa possibilidade, sobretudo em espaços mais amplos.
8. Evite utilizar excessivamente a linguagem no diminutivo, "apequenando" o ouvinte (Exemplo: Criancinhas, eu vou contar uma historinha deste livrinho, mas antes vamos cantar uma musiquinha)
Não há necessidade de infantilizar a linguagem para fazer um trabalho com as crianças. Escolha a história de acordo com a faixa etária do público e invista na própria ludicidade que a contação de histórias envolve. Não simplifique excessivamente a linguagem, permita que as crianças conheçam novas palavras, ampliem seu vocabulário.
9. Não se valer de posturas autoritárias
Não faça ameaças para obter a atenção da garotada, como ‘se não ficarem quietos, não continuo a história’. Se alguma criança estiver dispersa, aproxime-se, sempre com o olho no olho, o contato visual. Faça um carinho, faça como se, naquele momento, estivesse contando a história só para ela, sorria. Elas normalmente prestam mais atenção.
10. Selecionar as histórias levando em conta coerência cidadã
Procure selecionar seu repertório com base em histórias que apresentem valores como respeito, tolerância, solidariedade, bondade, gentileza, amizade e outros. Priorize as que primem pela ética e senso de cidadania. O contador de histórias é, antes de tudo, um educador e essa atividade não consiste apenas em um entretenimento, mas em um treino para a vivência cidadã.
11. Evite explicar a história. Deixe o seu público formar seu próprio repertório moral
Evite explicar a história ou a moral da história. Não imponha a sua leitura da narrativa às crianças. Cada ouvinte apresenta uma experiência particular de entendimento da história e todas as leituras enriquecem o momento da contação. Estimule a troca de impressões sobre o conto, entre as próprias crianças.
12- Contar histórias sentado ou em pé
Normalmente, com um número menor de crianças, é possível criar uma atmosfera mais aconchegante, contando a história sentado, com as crianças em círculo. No caso de um maior número de crianças, torna-se mais proveitoso contar a história em pé, com liberdade de movimentos.
13- Se der branco, continue. Não faça caretas, use a criatividade e improvise
Haja com naturalidade, se der branco. Use a criatividade no improviso, nunca faça careta demonstrando para todos que deu branco, saiba que naquele momento só você sabe a história que está sendo contada.
14- O tempo da história
Uma história bem contada, rica de detalhes e com envolvimento do público deve que ter, no máximo, 15 minutos. Mais longa que isso poderá se perder a concentração do público, principalmente, o público infantil. Você poderá encurtar a história se perceber que as crianças não estão aproveitando bem a contação, por algum motivo que merece investigação de sua parte ou alongar a história, se perceber que as crianças estão curtindo bastante a narrativa.
15- Se a história for lida, a narrativa deve ser tão animada como se fosse contada
Se optar em ler as histórias, usando o livro, leia com emoção e encantamento para que todos se envolvam na magia das histórias. Procure ler exatamente o que está escrito, pois as crianças costumam acompanhar a narrativa, lendo junto algumas palavras. Explore bem as imagens e dose os comentários sobre a história, de sua parte ou da parte das crianças, para que não se perca o fio da história.
16- Atenção ao analisar as histórias para diferenciar o público mais adequado para ouvi-las (público adulto, juvenil ou público infantil);
Analise bem as histórias para não contar uma história muito infantil para um público adulto, pois nem todos gostam de narrativas direcionadas às crianças, embora todas sejam muito instrutivas e ricas, inclusive para adultos. Ou contar uma história adulta para um público infantil, já que elas não criarão uma atmosfera de identificação por parte dos pequenos. Cuidado, igualmente, para não contar histórias infantis para jovens, pois eles não querem, de modo algum, ser confundidos com os pequenos. Há histórias específicas para os jovens, que tratam de sua realidade, seus gostos e interesses. Essa questão é muito séria, porque pode comprometer seu trabalho como contador de histórias.
17- Estimule a participação do público durante a contação de histórias
A participação do público, conhecida como interferência, é muito boa para você garantir o envolvimento de todos e, principalmente, a alegria com a contação de histórias. Você pode combinar, por exemplo, que toda vez que fizer um determinado gesto, eles falarão uma frase específica. Ou fazer uma pergunta durante a história. Pode cantar uma música que todos conheçam durante a história, pedir que batam palmas...
18- Você pode usar uma mala colorida, uma sacola colorida ou um carrinho colorido, para transportar seus objetos de contação de histórias
O público fica encantado para saber o que o contador vai tirar de sua mala ou de sua bolsa colorida de contação de histórias. Esses objetos coloridos de transporte são importantes para criarmos todo um clima de interação e felicidade. Use sua criatividade e procure surpreender as crianças, fugindo ao previsível e investindo no novo.
19- Usar recursos visuais (objetos como livros, brinquedos, lençóis, fantoches, marionetes, dedoches e outros recursos);
A contação de histórias se torna mágica associada a objetos que representam os personagens e os cenários em que as histórias se passam. Os objetos ajudam na captação da atenção das crianças, sobretudo as menores. Eles já carreiam em si a magia e a inventividade que as histórias evoca, são um recurso pedagógico. Não se preocupe com materiais de alto custo, a simplicidade carreia muita beleza em si. Sucata, papéis coloridos, barbante, cartolinas, isopor... tudo pode ser matéria-prima para uma boa história.
20- Usar adivinhas, trava-línguas, parlendas
É legal quando é possível a utilização de adivinhas, trava-línguas, parlendas no antes, durante ou após as histórias, pois a contação se torna um momento muito prazeroso de humor e de alegria. As crianças se sentem desafiadas e estimuladas com os jogos verbais.
21- Cybercontador de histórias
Atualmente, alguns contadores estão utilizando tecnologias como projeção do livro no Power Point. Isso pode ser feito sobretudo com livros imagéticos, que não contêm palavras, pois a história vai se construindo com as crianças durante a apresentação dos slides.
22- Diferenciar o tom da voz para cada personagem (grave e agudo) e para cada momento da história (tensão, alegria, medo e outros);
Cada personagem pode ter sua tonalidade de voz, para que as crianças consigam diferenciar quando um personagem se expressa e quando o outro se expressa. Assim, o contador tem que treinar muito antes da contação de histórias, pois ele pode confundir as vozes, quando há muitos personagens.
23- Formar seu próprio repertório
Muitas histórias estão nos livros à nossa espera, são histórias autorais, para lermos, estudarmos e, acima tudo, contá-las para todos que buscam entrar nesse mundo do saber. Outras estão apenas nos domínios da oralidade, passando de geração a geração. O contador deve formar o seu próprio repertório, se possível com histórias diversificadas, que envolvam até outras culturas.
24- Atividades após a história
Teóricos afirmam que a contação de histórias é o ponto de partida para o desenhar, o pintar, o musicar, o teatralizar... Procure sempre realizar atividades relacionadas à história, podendo fazer quebra-cabeças, figuras para colorirem, origamis, fantoches e outros.
25- Reconto
Outra atividade interessante para ser feita após a história é o reconto, quando as crianças se transformam em contadoras de histórias. Pode ser feita individualmente ou coletivamente e a ideia é que as crianças contem a história novamente.
26- Levar livros
Se possível, leve o livro de onde extraiu a história para mostrar às crianças, comentando algo a respeito do autor e do ilustrador, humanizando os autores e valorizando a leitura. Ainda é possível levar outros livros para ensiná-los inclusive a manuseá-los. A contação associa livro e diversão, prazer, ludicidade.
27- Cuidado com o espaço
Procure contar a história em um ambiente favorável, se possível sem cartazes ou objetos que não tenham relação com a história. Verifique a limpeza do local e as condições dos equipamentos, como rádio ou computador.
28- Estude sobre contação de histórias
Busque sempre a sua capacitação com a leitura de livros e realização de cursos sobre contação de histórias, pois o estudo sempre aprimora nosso trabalho.
29- Faça do ato de contar histórias um momento prazeroso
Saiba que o momento de contação de histórias é um momento de felicidade de todos, principalmente, para o contador ou contadora que estão fazendo algo bom e engrandecedor para o próximo.
Lendas
30- Lenda indígena
Querido diário,
Hoje contei uma lenda indígena para uma turma do 3º ano.
No meio da história, dois alunos entraram na sala brigando e simplesmente “roubaram a cena”. As crianças apontavam os dois para a professora, que não tomou nenhuma atitude, por estar envolvida com seu diário de classe. Eu não tive como prosseguir a história...
Separei os dois e apenas perguntei: “Sabiam que vocês estão perdendo a história do índio carinha-pálida?”
Eles pararam de brigar e voltaram para seus lugares.
Esse episódio provocou-me reflexões.
Por que não me assegurei de que todos os alunos da turma estavam presentes antes da dar início à história? Deveria ter pedido a ajuda da professora quando me dei conta da briga? Poderia ter incluído algum episódio de brigas ou guerras na história do indiozinho e tocado na questão indiretamente?
A professora sempre ameaça a turma, afirmando que, se não se comportarem, não ouvirão mais as histórias.
Ameaças me incomodam muito, muito.
Certa vez, em uma oficina, uma senhora me endereçou uma pergunta sobre disciplina. Eu afirmei que normalmente eu não enfrentava esse tipo de problema, pois as crianças ficam vidradas na história e prestam bastante atenção.
Contudo, sugeri que ela olhasse nos olhos das crianças e se aproximasse mais das que estivessem dispersas, fizesse um carinho em uma, baixasse o volume de voz para atrair a sua atenção.
Ou que combinasse as regras com a turma antes da contação de histórias, de preferência de uma forma lúdica, com cartazes ou música, por exemplo.
Mas, além disso, acho que ter mais alguém, ajudando o contador na disciplina da turma, é fundamental.
Há, igualmente, a opção de levar histórias que versem sobre a importância do ouvir, do escutar, do ter um bom comportamento, do ser pacífico...
Nada deve ser feito, porém, com rispidez ou com um tom autoritário para não quebrar a magia do momento.
Enfim, são caminhos, não são receitas.
O importante é reconhecer que os contadores de histórias são muito mais educadores do que recreadores!
Reconto
29- Reconto
Querido diário,
Estou às voltas com o conceito de “reconto”.
Estudiosos sugerem que as crianças, em algumas oportunidades, recontem a história ao final da contação. Isso, basicamente, por dois motivos.
Primeiro, quase nunca temos o hábito de atuar como espectadores das crianças em suas manifestações de narração de histórias.
Segundo, podemos avaliar o desempenho linguístico das crianças, no que se refere à fluência, nível de vocabulário, formação de frases simples e complexas, conhecimento da estrutura da narrativa.
Eles afirmam, inclusive, que se podem gravar as contações das crianças e comparar seu desempenho ao longo do ano.
Já tive a oportunidade de coordenar uma atividade de reconto.
Tratava-se de uma oficina de contação de histórias para crianças.
Eu apresentei duas versões da fábula da cigarra e da formiga. Uma em que a formiga ajuda a cigarra e outra em que ela não ajuda.
Elas votaram em qual havia gostado mais.
A formiga solidária venceu.
Então, pedi que elas recontassem a história.
Elas sentiram dificuldades, ficaram travadas, embora houvesse figuras em cartazes para que elas se baseassem.
Comecei a ajudar, fazendo perguntas. Como começa a história? Quais são as personagens? O que aconteceu? Como terminou? Além disso, dei algumas pistas.
Aí, deu certo.
Já aconteceu algo nesse sentido numa turma de jardim. As crianças me pediram para recontar a história. Eu propus que eles me ajudassem. Eu ia contando e eles iam completando partes da história.
Na verdade, penso que sempre recontamos histórias, pois uma contação nunca é igual à outra, não é?
Todo conto é um reconto!
Colegas
28- Colegas
Querido diário,
Ontem, prestigiei uma ciranda de histórias na biblioteca do meu bairro e fiquei encantada com a apresentação de um contador.
Ele narrou algumas histórias, mas também cantou cantigas de roda e fez brincadeiras com as crianças.
Elas vibravam!
O contador planejou uma apresentação recheada de interação com a plateia. Ele intercalou música, história e brincadeiras.
Levou uma sacola cheia de livros e apresentou cada um com ar de mistério, de encantamento. Usou palavras mágicas para dar início às histórias. O interessante é que ele usava livros para mostrar as imagens, mas não lia as tramas. Ele as tinha memorizado e só se valia do visual dos livros.
Em alguns momentos, pediu silêncio e atenção, mas sem aquele tom autoritário ou sisudo (as crianças ficavam excitadíssimas com as brincadeiras).
Troquei meia palavrinha com ele no final, anotei os títulos dos livros que ele usou e saí da biblioteca disposta a imitá-lo.
Afinal, o cara era o máximo!
Felizmente, esse desejo durou pouco.
Logo compreendi que cada contador de histórias tem o seu próprio estilo e que isso é inimitável.
Podemos admirar nossos colegas e nos inspirar em alguns para incrementar a nossa performance. Mas precisamos ser autênticos sempre, sempre.
Aliás, nisso reside a riqueza da contação de histórias.
Já imaginou vários contadores apresentando uma mesma narrativa?
Eu já tive a oportunidade de ouvir a contação de uma mesma história por contadores diferentes. Um se atinha mais à oralidade, enquanto o outro usava objetos lúdicos. Cada qual me encantou de forma diferente e as plateias de ambos curtiram bastante a história.
Alguns contadores dão um toque de comédia às histórias, outros dão um ar de sofisticação ou de simplicidade, há os que dão um ar de leveza ou de mistério e assim vai.
Como se diz por aí, cada um é cada um... E o sol das histórias nasce para todos!
Superproteção
27- Superproteção
Querido diário,
Você sabia que, como contadores de histórias, nós podemos ser superprotetores?
Isso acontece quando apenas selecionamos histórias pautadas em “happy ends” para compor o nosso repertório.
Pode haver uma tendência, consciente ou inconsciente, de apresentarmos às crianças um mundo colorido, isento de conflitos e frustrações.
Quando isso acontece, nós queimamos a ponte que se estabelece entre as histórias e a vida real, pois as próprias crianças sabem que o mundo não é colorido o tempo todo.
Na verdade, em muitos casos, somos nós mesmos que não nos sentimos preparados para lidar com as dicotomias da vida e isso acaba se refletindo no nosso repertório.
Isso já aconteceu comigo.
Havia uma história de uma menina que queria muito ganhar um cachorrinho. Após muito tempo de expectativa, os pais resolvem lhe dar o cão e ela escolhe o animal. Mas o cachorro é roubado e, no final da história, ela ganha outro.
Gente, eu não me conformei!
Queria porque queria mudar o final da história. Queria que a menina achasse o seu cachorrinho roubado. Queria que a garota fosse feliz com ele.
Não servia outro cão.
Não pra mim.
Quando percebi que, na verdade, eu tinha dificuldade de lidar com a perda, aceitei a história e com ela cresci muito, muito.
Além disso, para a minha surpresa, as crianças aceitaram o fato que a história trazia, com naturalidade, ainda que envolvidas emocionalmente com o cãozinho que elas imaginaram: “Tia, roubaram o Pirata, né?”.
Uma das funções da contação de histórias é acordar a criança para a vida. E, na vida, se perde e se ganha, se chora e se ri, se erra e se acerta, se cai e se levanta...
Claro, isso não impede uma visão otimista de que podemos superar os desafios, fazer das quedas passes de dança, escrever uma história bem mais feliz do que triste.
Afinal, “eu sei que a vida podia ser bem melhor (e será), mas isso não impede que eu repita: é bonita, é bonita e é bonita”.
Folclore
26- Folclore
Querido diário,
Estamos desenvolvendo um projeto sobre o folclore na escola onde trabalho. Inacreditável, mas não tenho nenhuma lembrança de ter ouvido histórias folclóricas nas escolas de minha infância.
Estou contando a história “Festa no Céu”, escrita por Ângela Lago.
Uso um avental com as personagens do nosso folclore e faço adivinhas sobre elas antes de dar início às histórias.
Eles estão curtindo bastante a narrativa, estou usando fantoches de varas.
As crianças participam muito no começo da história, pois pergunto quais seriam as guloseimas que teriam na festa. Elas respondem, empolgadas: bolo, cahorro-quente, refrigerante, brigadeiro, pipoca, maçã do amor, salgadinhos, sucos...
Além disso, estou trabalhando algumas parlendas com eles:
“A galinha do vizinho bota ovo amarelinho. Bota 1, bota 2, bota 3... bota 10!”
“Um elefante incomoda muita gente, dois elefantes incomodam, incomodam muito mais, três elefantes incomodam, incomodam, incomodam muita gente...”
“Me responda você, que parece sabichão, se lagarta vira borboleta, por que trem não vira avião?”
“Batatinha quando nasce, se esparrama pelo chão, a menina quando dorme, põe a mão no coração.”
“Chuva e sol, casamento de espanhol, sol e chuva, casamento de viúva!”
“Galinha choca comeu minhoca, saiu pulando feito pipoca.”
Aproveitei o ensejo para mencionar brincadeiras folclóricas: pipa, pião, bolinha de sabão, bolinha de gude, patinete, corda, chicotinho queimado, cabra-cega, elástico, pelada, pique-bandeira, pique-alto, pique-esconde, catavento, amarelinha...
Elas reconheceram a maioria das brincadeiras e relataram como são, as que mais gostam, as que brincavam na própria escola.
Acho importante trabalharmos o folclore, pois tratamos da nossa identidade cultural, das nossas raízes e incutimos valores como cidadania e pluralidade cultural nas mentes e corações das crianças. Estou feliz por poder levar esses conhecimentos aos pequenos, eu não tive isso em minha escola de infância, e está sendo especial pra mim proporcionar o que não tive.
Viva o folclore nacional!
Tipos de textos
25- Tipos de textos
Querido diário,
Estive refletindo sobre a integração entre a contação de histórias e os diversos gêneros textuais ou tipos de texto. Acho que, além de favorecer o ensino de língua portuguesa, essa interface pode enriquecer as maneiras de se contar a história.
Imagine narrar a história da galinha ruiva e usar uma receita de bolo...
Imagine narrar a história dos três porquinhos e se valer de uma pesquisa envolvendo os tipos de casas construídas no mundo...
Imagine narrar a história da Cinderela e pedir licença para atender a uma ligação telefônica imaginária da fada madrinha...
Imagine narrar a história do Pinóquio e ler o diário da Fada Azul...
Imagine narrar a história da Cigarra e da Formiga e levar jornais com anúncios de emprego...
Imagine narrar a história da Pequena Sereia e distribuir cartões-postais de praias brasileiras...
Enfim, transitar pelos gêneros de textos pode propiciar um maior dinamismo e entusiasmo, prendendo a atenção dos ouvintes e os levando a conhecer diferentes gêneros textuais.
Já fiz isso com uma poesia. Levei uma mala enfeitada de fitas coloridas e cheia com os objetos da história. Então, declamei um poema sobre uma maleta de sonhos... Essa poesia pertencia à própria autora da história que eu ia contar.
As músicas eu uso sempre...
Já utilizei uma charada como senha para começar a história. Já usei uma receita de culinária durante uma contação. Já cantei uma cantiga de roda com as crianças após a história. Já li cartas de uma personagem durante a contação. Já fiz uma enquete no meio da história sobre a atitude de uma personagem.
Enfim, não devemos perder a oportunidade de surpreender as crianças com situações imprevisíveis para que a contação tenha sempre o efeito da surpresa, do inédito, do original, do inusitado, do inesperado.
Tenho essa preocupação porque já ouvi uma criança me dizer: “De novo isso?”
Mas também há o outro lado dessa história...
Algumas crianças, quando gostam de determinado recurso ou técnica, querem que você os repita sempre. Isso acontece com a musiquinha que cantamos antes da história. Eu até que tento iniciar de outra maneira, mas algumas turmas querem porque querem cantar a bendita da música! Rsrsrsrs!
Palmas para meus cantores mirins!
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